Fazer política em Portugal é, por estes dias, usar os media como um qualquer momento de terapia em grupo - veja-se o nosso PR e PM, dois bons exemplos desse desabafanço colectivo em directo que inunda as manchetes e as conversas dos mais incautos espectadores da cena política nacional.
O PM aconselha os jovens portugueses a trocarem de país - quase somos levados a acreditar que a recente chegada de capital chinês, levou o ilustre senhor a aconselhar os jovens a impulsionar cá esse maravilhoso modelo económico que assenta na exportação de população.
É bom exportar, senhor primeiro ministro, bem o sabemos. Agora não é bom passar um visto de saída a camadas da população como se isso fosse um "brinder", como se diz por aí, daqueles que se oferecem numa qualquer grande superfície. Ser-se português, gostar de ficar em Portugal não devia ser uma questão de oportunidade - se queremos que se exalte o amor ao que é nosso, devemos começar por arranjar lugar aqui para aqueles que, por gostarem um bocadinho disto (parecendo masoquismo, às vezes), serão os mais empenhados em levar isto para a frente.
Falar com pessoas, falar-lhes de uma realidade que elas conhecem e sofrem na pele, mais do que qualquer político por elas mandatado, não pode ser uma laracha lançada como verdade universal e inelutável por um conjunto de pessoas que, há uns bons meses atrás, enchiam directos com um tom ligeiramente mais inflamado com slogans em jeito de parangonas com cores de néon-esperança.
Sabe, Sr PM, por aqui gosta-se de arrojo, gosta-se de um Estado mais magro, sem que a magreza lhe roube as forças para fiscalizar e punir abusos calóricos cometidos em ilhas quentes off-shore e demais episódios assustadores que nos temos vindo a habituar a ver como sinais da suposta modernidade, como suposto produto da vocação reformista que tem caracterizado boa parte dos últimos tempos da democracia em Portugal.
Os políticos podem, hoje, parecer dandies - fica bem um fato bem cortado e uma gravata que não pareça vinda de uma ida a banhos, mas de clorofórmio. No entanto, não podem esquecer-se que devem, mais do que tudo, mobilizar o colectivo e não desancar forte e feio em tudo quanto seja réstia de esperança.
Fazer política não é ter uma conversa de café com os cidadãos - essa massa informe que escuta os discursos políticos são pessoas - e as pessoas são tramadas, Sr. PM. A cidadania faz-se, saiba-o o senhor, dessa coisa etérea e inefável chamada esperança. Sem esperança é como se o futuro fosse roubado do contínuo do tempo. E isso não é bom.
Explicar as coisas às pessoas é dizer-lhes que os sacrifícios, mais do que necessários, servem o propósito de tornar as coisas melhores, com mais sentido - esse que é o de, no fim de contas, ter cidadãos bem servidos.
Não se pode ter Serviços Secretos como uma espécie de força oculta, desgovernada e que ninguém sabe a quantas anda e, pior, a mando de quem. Não se pode ter a Maçonaria como um hobby de alguns como um fantasma nas decisões que afectam todos.
Os políticos correm o risco de perder o apoio, quando a sua legitimdade periga - e, num pântano desgovernado, o tom errado ou uma frase despropositada, podem ser o rastilho que anuncia o princípio do fim.
Em Belém mora esse Presidente-do-tacho-ao-lume, o Sr. Silva - os seus mandatos têm oscilado entre o papel de chefia do Estado e o de um qualquer idoso a desfiar queixumes numa tarde soalheira, num banco de jardim.
Não se governa dia sim, dia não, sr. PR. A governação é uma coisa dinâmica que não se faz apenas quando o betão ajuda a firmar um percurso político. Aliás, Sr. PR, se já não tem o betão, a retórica foi uma coisa que nunca teve como aprendida.
E, ultimamente, mais se não vê que larachas - sim, larachas sobre vacas que sorriem, larachas pseudo-motivadoras no discurso de Natal a uma Nação que definha, larachas sobre como é heróico optar pelas reformas que acumulou do tempo em que as vacas eram gordas, mas só sorriam a alguns.
Cavaco tem sido uma decepção - mudar o país não faz parte da sua agenda e, verdade se diga, a inacção não pode ser justificada com uma literal leitura das competências que lhe cabem.
Nenhuma Constituição proibe ou diz como não se deve cair num discurso demagógico e ridículo. O pior de tudo, bem vistas as coisas, é pensar que o seu tom é sincero - quem o ouve pensa, afinal, que os sacríficios são só maus quando lhe doem e que o estoicismo que pede a uns é missão que não é sua.
Pois Governar, se é de legitimidade que falamos, é renovar essa mesma legitimidade a cada momento -ela não nasce de um qualquer método electivo e fica por aí. Os media servem para muita coisa má, mas tornam a demagogia numa coisa flagrante e ruinosa.
O politicamente correcto não é bom, mas o politicamente incorrecto - essa incorrecção descarada do queixume mimado é uma coisa feia de quem só parece saber governar quando tudo são sorrisos - os das vacas e não só.
A adversidade é um teste à eficácia das soluções e dos sistemas, mas também, isso sim, uma forma de nós portugueses deixarmos de ser como "vacas a olhar para um palácio (de S.Bento ou Belém)" e começarmos a mostrar que, em tempos como estes, as vacas magras não estão para sorrisos.
E ainda bem.