Rewind

domingo, 16 de agosto de 2015

o vento sem mapa|

também o vento vem sem mapa, amor

e repete nos poros do caminho o teu nome

uma, duas, muitas, todas as vezes


olha o vento a fingir que é verão

se calhar, podíamos retomar o poema

que dizes,

de enfeitares, de novo, o cabelo

com a madrugada inteira do meu desejo


sabes, amor, a saudade é a espera entre sonhos

podias voltar a tempo de me leres baixinho -

é outra vez verão nessa página

desarrumemos a distância como as gavetas onde deixamos a roupa


amor, faz como o vento e passa por aqui outra vez

veste a minha camisa outra vez

e lê-me baixinho

pega num cigarro, se quiseres

eu deixo.


lê-me como se me esperasses

veste, se puderes, a camisa azul

e vê que o bolso traz o teu nome escrito


foi a saudade que o bordou

[do lado de dentro.]


RM

sábado, 1 de agosto de 2015

Avó,

como se passar pelos teus olhos fosse sempre como entrar em casa
as pernas tão habituadas aos degraus que demoram o nosso abraço
(mas ansiosas)
como se passar pelos teus olhos fosse sempre abrir a janela da infância e poder vir gritar ao terraço,

Vovó!

só para saber que estás aí e vieste deixar-me flores frescas junto ao peito.


como se passar pelos teus olhos fosse sempre não ter que mudar de roupa
a pele habituada ao conforto destas palavras amenas e amplas como uma brisa de verão
em que escolho agasalhar a nudez brincalhona da nossa intimidade.

como se passar pelos teus olhos fosse chumbar sempre a matemática
as pernas tão habituadas a aldrabar a espera do nosso encontro
e subir os degraus dois a dois fosse amar-te mais e com mais força.

porque passar pelos teus olhos foi sempre não precisar da chave da porta
as mãos habituadas a este amor-de-porta-no-trinco
o coração habituado a ter na tua voz o melhor miradouro de mim mesmo.

sabes, Avó, amo-te e passei para te dizer isso mesmo.

não bati a porta.

[volto logo para te ouvir a resposta e fazer batota ao subir os degraus]

RM