as pernas tão habituadas aos degraus que demoram o nosso abraço
(mas ansiosas)
como se passar pelos teus olhos fosse sempre abrir a janela da infância e poder vir gritar ao terraço,
Vovó!
só para saber que estás aí e vieste deixar-me flores frescas junto ao peito.
como se passar pelos teus olhos fosse sempre não ter que mudar de roupa
a pele habituada ao conforto destas palavras amenas e amplas como uma brisa de verão
em que escolho agasalhar a nudez brincalhona da nossa intimidade.
como se passar pelos teus olhos fosse chumbar sempre a matemática
as pernas tão habituadas a aldrabar a espera do nosso encontro
e subir os degraus dois a dois fosse amar-te mais e com mais força.
porque passar pelos teus olhos foi sempre não precisar da chave da porta
as mãos habituadas a este amor-de-porta-no-trinco
o coração habituado a ter na tua voz o melhor miradouro de mim mesmo.
sabes, Avó, amo-te e passei para te dizer isso mesmo.
não bati a porta.
[volto logo para te ouvir a resposta e fazer batota ao subir os degraus]
RM
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