Sempre pensei que tudo existia mais pelas pequenas coisas. Não gosto desses momentos em que tudo se parece cravar no fundo do olhar e do peito de alguém. Gosto desse toque manso a lembrar um caminho ja percorrido.
Gosto quando a vontade veste o hábito e se enrola nele, muito serena. E poder-se, enfim, amar ou segurar nas coisas com essa calma de quem sabe que as coisas continuarão amanhã.
Como os dias de Verão em que podia quase jurar que a luz ia durar para sempre. E todos os dias seriam dias para ver a tua pele banhada de esperança; reparar como o suspiro quente das horas te balança o cabelo suave. Como era bom adormecermos deitados no chão, com a sombra a embalar o teu corpo abandonado ao meu. E tu acordares-me com um beijo suave - como um até já de quem vai lá dentro e traz limonada fresca. Podia reparar na graça do teu vestido e na sombra que nascia dele para inundar o chão. Sei que vieste depois e bebemos a limonada - os teus lábios com um sabor ácido, o verão e esse vestido.
Não sei que palavras se disseram - ou talvez saiba- mas não tive medo de que elas fugissem ou desaparecessem. Pudemos dormir juntos na sombra e beber limonada e respirar fundo.
Ambos agimos como se as coisas fossem durar para sempre - todos os verões da nossa vida, com limonada, calor e um cão, que sabes como gosto deles.
(e os filhos, talvez.)
Bonito Verão, esse. Descobri que podia ser mais fundo e penso até que o ar passou por partes de mim que desconhecia. Como se se abrisse uma janela e ficássemos suspensos na contemplação.
Gostava do hábito - sem essa monotonia que murcha as flores do jardim, lá fora, e as nossas emoções. Gostava da pele um do outro nos servir tão bem.
E desses beijos miúdinhos e pequenas palavras susurradas ao ouvido. Dessa gargalhada que quase podia imaginar a ocupar os serões de todos os dias ainda por vir.
Não pus a perda a jantar connosco e a dormir connosco nesse embalo perfeito.
Dizer as palavras e fazer as coisas soarem a despedida era começar a desenhar-lhes um fim.
Quando nem o vemos e, sim, acreditamos que os verões serão todos nossos, o nosso gesto mergulha nesse ir ao fundo - como se o ar os enchesse todos. Amar com o gume da paixão bem afiado é ir ao fundo das coisas, mas queimando o ar.
Por isso, lembro esse Verão - e todas essas pequenas coisas que semeaste nos meus poros e me coseram na pele o gosto por um amor que pode morar num simples rodar de vestido; numa tarde abafada em que te vejo dormir e te sinto respirar perto da minha face.
Um amor que pode durar todos os verões da nossa vida.
Com o calor, a limonada e o vestido.
E um cão que sabes como gosto deles.
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