O teu braço preso no meu,
Meu amor, vens comigo ali e vimos já?,
Palavra de honra que, creio, nunca ter conseguido dizer-te - não.
Na verdade, foste comigo, também tu, a todos os lugares da minha vida - nunca, por uma vez, deixei de sentir o teu braço atado no meu, os teus dedos finos e compridos apertando-me a pele como que cegando de vez um nó que não se podia soltar.
Nunca te perguntei sequer onde íamos - contigo todos os passeios são um ritual de absoluto prazer e cumplicidade - a tua voz, ainda agora, na minha cabeça a puxar a corda do futuro, a ousar sonhar, planear, dançar por cima de todos os abismos e impor-lhe o que o coração te diz sempre - mergulha-se no desconhecido com uma fé de pedra de que, venha o que vier, há de continuar o amor.
Por isso, atemos sempre as nossas mãos, Vovó, - juntos, seja qual for o caminho, sejam quais forem os lugares por onde a vida nos faça passar, que as nossas mãos sejam como marcos de pedra velha na estrada que contam os quilómetros - mas, sempre, os quilómetros a que estaremos, um e outro, de um regresso, de um reencontro, de um abraço demorado ou de uma conversa longa - sempre isso.
Que em todas as paisagens, o vento me traga o cheiro de casa - e que eu, vaidoso e feliz, possa passear-te pelas ruas e alamedas todas do meu caminho como a luz inteira que foste sempre para mim.
Disse-te eu,
Vovó, achas que te agradeço vezes suficientes?,
e tu,
Meu amor, eu é que tenho que vos agradecer por serem sempre tão meus amigos,
Mas eu, ainda hoje, acho que o amor tem que se merecer - que, tal como tu nos esperaste de braços abertos, - a vossa fotografia com a dos Pais, por cima das nossas camas - há que te mostrar que o meu braço está, ainda, aqui - agarra-o, Milinha, e vamos os dois.
Aprende-se a andar, sobretudo, com quem nos mostra, de verdade, o que é o amor - quando alguém nos ama, o corpo ergue-se, primeiro, para alcançar os braços que o convidam a entrar; depois, mais tarde, o corpo repete tudo como um hábito feliz em que tudo o que quer é que a camisola da pele - e o cheiro da memória - lembrem ao coração que está em casa.
A minha camisola-de-pele tem os vincos de todos os caminhos que foram nossos e sente, até hoje, o peso dos teus dedos a ensinar-me como se anda pelo mundo.
Caso queiras ir a qualquer lado, Milinha, pede-me,
Queres vir ali comigo num instante, meu Amor, e vimos já?,
eu irei, claro,
só para, como sempre, poder ser o rapazola mais feliz e mais vaidoso da rua - quem nos vir, reparará que, até hoje, a minha camisola-de-pele é a mesma - a mais confortável, a mais perfumada, a mais verdadeira e vincada de todas.
Nas dobras dos meus braços, as marcas dos teus dedos como vincos de quem nunca se quis perder até chegar a casa.
Vamos os dois e,
seja qual for o caminho,
seja qual for a distância,
que as nossas mãos contem os quilómetros,
e haja sempre um regresso,
para um reencontro,
um abraço
ou uma conversa longa,
para mim, que haja sempre tempo de te dizer,
obrigado,
a camisola-pele arrepiada inteira da luz que só tu acendes quando te vejo.
RM| XXX|IX|MMXVIII
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