faltou dizer-te que o Verão veio depois.
e, no terraço, as horas se atrasaram todas esquecidas de morrer.
faltou dizer-te que os canteiros se abriram todos como uma carta perdida há muito no correio e que ainda havia um perfume de pele viva dentro deles.
faltou dizer-te que o mar se lembrou de ti e nos braços quentes da água quis dançar-te ao luar por entre as rochas.
faltou dizer-te que as páginas do teu livro continuam marcadas na fenda da ausência dos teus dedos.
faltou dizer-te que tinha já escolhido a música, posto a mesa e começado a esperar por ti há muito tempo.
faltou dizer-te que o ar quente se arrasta nos muros e agita os arames da roupa ao teu encontro.
faltou dizer-te que as bicicletas se perderam e não sabem mais o caminho de volta a casa.
faltou dizer-te que ainda te chamo para dentro das divisões da casa com a repetição de um búzio que não esquece o mar.
faltou dizer-te que o poema escrito na parede branca das tuas coxas continua incompleto.
faltou dizer-te que todos os espelhos são agora grandes demais. tu já não vens compor-me as camisas e eu não tenho mais pretextos para te roubar um abraço antes de ir.
faltou dizer-te que ainda não tínhamos visto os filmes todos. sinto falta de pressentir o avanço das tuas mãos nas minhas pernas pelo lume que se acendia nos teus olhos.
faltou dizer-te desculpa mas o amor dói. faltou dizer-te que ainda ando a aprender a escrever o nome certo das coisas por cima dos riscos das tentativas que falharam.
faltou melhorar a caligrafia, eu sei.
faltou dizer-te está tudo bem.
faltou dizer-te vai ficar tudo bem.
faltou dizer-te que não sei dizer mas que te amo.
[o amor é, tantas vezes, eu e tu a dizermos a mesma palavra em línguas distintas.]
faltou dizer-te tanta coisa.
mas o Verão veio. por isso, volta.
uma praia inteira de saudade só pode querer dizer que te amo.
Sem comentários:
Enviar um comentário