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segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

às vezes tu|

Às vezes tu na luz doce da manhã
E na minha boca ainda ardendo a pele da tua
Às vezes tu no silêncio do dia que começa
E ainda me tocas a pele nua 
 
Às vezes tu dentro do sonho que me abraça
E no desassossego do vento um hino que te chama
Às vezes tu no vidro limpo da memória
E o meu peito ainda diz que te ama

Às vezes tu no cheiro das coisas que te guardam
E no reflexo de tudo ainda há os teus dedos
Às vezes tu na valsa das coisas esquecidas
E ainda sei de ti quais os segredos

Às vezes tu nas flores de um mundo preguiçoso
E nos espelhos do caminho ainda pareces chegar
Às vezes tu no voo das aves que regressam
Como se ainda fosse tempo de te amar

RM



domingo, 29 de dezembro de 2013

saudade|

A estrada dobra sempre na saudade
E dentro de mim fica o sonho eterno do amor
É lá longe que fica esperando a verdade
Para que a vida se cumpra sempre com fulgor

Na distância é que o perfume das coisas dura mais
E é no escuro que os olhos buscam sempre e mais a luz
É na distância que os dias não são iguais
Se lhes falta na carne o beijo que seduz

Vens ter comigo no vento que desliza devagar
E enrolas teus braços no meu peito com vontade
Sei que és tu quem vem para me abraçar
Porque o vento que vem traz liberdade

Na minha pele se escreve a tua ausência
Com a vontade que tenho de voltar
O teu nome é no sangue uma evidência
Como um sonho que se cumpra devagar

RM

o mar|

O mar demora a despedida no fundo dos teus olhos
E a noite parece chegar embalando os beijos
O mar traz no eco o amor e os seus despojos
E as estrelas são um mapa vivo dos desejos

É no abraço sereno da noite que te dispo da pele o mundo
E é no calar-se da vida que ouço melhor o caminho
Se tudo na solidão é ir-se ao fundo
É por ti que procuro se estou sozinho

Sonho tua boca no rumor da maré que regressa
E teu corpo vem chegando no luar que escorre na areia
Sonho que a vida serena recomeça
E que meu peito já nada receia

Espero na saudade o teu despertar
E cravo no horizonte o peito sempre sonhando
Espero do infinito ver-te chegar
Para no meu sonho comigo ires acordando

RM



sábado, 28 de dezembro de 2013

Vovó,

O dia é azul porque o mar se enamora do teu olhar
E em cada flor que sorri é tua boca que vive
Cada vez que nos teus braços escolho ficar
É um pedaço de mim que sobrevive

Só contigo vejo no verde a esperança
E o chão não mais se afunda no meu medo
É quando o vento leva o dia numa dança
Que ir embora é sempre cedo

É quando a memória demora no fundo do meu peito
Que lembro do passado os dias doces
Que viva desse tempo o sonho perfeito
Sem temer que na esquina tu te fosses

Contigo tive, a cada dia, um futuro maior
E tudo era um doce eco de regresso
De ti guardo a lembrança para onde for
E é para ti toda a vida que eu peço

Seremos sempre do caminho as suas margens
E no mundo deixaremos um só sentido
O nosso amor será maior depois de todas as imagens
Em que um abraço fundo seja sempre repetido

RM 





procura|

Procuro o que falta no que me deste
E todo o infinito morre no vidro frente ao mar
Procuro nas palavras que disseste
A promessa que não podia acabar

Procuro o que podia dizer-te em palavras que não existem
E emendar a finitude com o beijo sereno do amor
Procuro em cada uma das coisas que persistem
A vida como um mar de luz com seu rumor

Procuro por detrás da sombra da distância
O jardim perfumado onde dormias
Procuro como uma criança solta na infância
Cada uma das loucuras que fazias

Procuro por nós no fundo do medo e do vazio
E encontro-me no teu corpo enlaçado
Procuro por ti como um rio
Que ao mar chegasse, enfim, já libertado
 
RM

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

a ti|

O suor é o orvalho do Inverno que ateaste
E os teus beijos são no céu um dia aberto
O desejo é um deserto de luz que devoraste
E a noite é um coração livre e desperto

Os beijos são gritos imensos de uma luta
E as promessas são feridas que saram ao poente
O rumor do teu cheiro chegando já se escuta
E tudo é um mar de vida de repente

Tua boca é do horizonte a liberdade
E tuas mãos são linhas fundas na areia
Teu cabelo é o luar dançando na cidade
E tua voz de sonho é o canto da sereia

Teu peito é como uma janela sobre a vida
E teu amor é canção que fala do que te dei
A saudade é uma carícia mil vez repetida
Como a verdade dos beijos que te deixei

Somos do mar o destino imortal
E da memória a eterna poesia
Somos mais do que tudo o que é real
Somos tudo por quanto eu morreria

RM

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

tu|

A tua voz é um segredo escondido no vento
E é o mar que chega e me deixa na boca o teu sabor
O teu corpo é o manto escuro do firmamento
Em que se tece o encanto suave do amor

O teu ventre é uma carta escrita no pó do caminho
E é dos troncos altos que se avista o fundo do teu olhar
Os teus dedos são penas suaves beijando com carinho
E o meu peito abriga-se, enfim,  a repousar

A tua boca é um fruto fresco de um bosque de luz
E é da tua pele que nasce o perfume de todos os encantos
É teu o labirinto em flor que me seduz
E teu é também o mais belo dos cantos

O teu retrato é o horizonte maior imaginado
E teus cabelos são montanhas que pedem o céu
O meu coração é o mais feliz condenado
Por saber que um dia já foi teu

RM    

os pássaros não vêm mais|

E os pássaros não vêm mais
Para beber da Primavera que murchou na tua ausência

Eis que os pássaros partem na saudade vazia do cais
E no rosto das coisas apenas a sombra é permanência

E os pássaros não vêm mais
E tudo é uma valsa lenta de passado e penitência

E se os pássaros não vêm mais
É porque o céu sem ti é como ter do sonho somente a aparência

RM 

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

não mais|

Não nascem flores em mãos vazias
E não há luz nas margens de rios sem céu
Não há mais paz sem as palavras que dizias
Ou que o teu corpo deixava voando no breu

Não nascem mares em terras sem fome de infinito
E não se bordam sonhos em desertos de saudade
Não há mais que um tempo morto e maldito
A que só tu trarás de volta a liberdade

Não nascem sorrisos em jardins de sombra e solidão
E não traz a chuva promessas do que não há
Procuro por ti nas linhas da minha mão
Como num porto a que o teu ventre, um dia, voltará

RM

verso incompleto|

Há um verso incompleto no fundo dos meus olhos
Como uma janela esperando a luz para se abrir
Há um verso incompleto no sangue dos meus lábios
Que só nos teus aprendem a doçura de sorrir

Há um verso incompleto no tempo que morre sem te abraçar
Como uma estrada vazia em que te perdesse
Há um verso incompleto no sangue cego das veias
Como a pele morta das carícias que te fizesse

Há um verso incompleto no voo distante do vento
Como uma varanda despida num Inverno infinito
Há um verso incompleto no exílio forçado das flores
Que morrem, como eu, na ânsia do que havia para ser dito

RM

sábado, 21 de dezembro de 2013

jardim|

O teu peito é o lado de dentro de um jardim
Com água que desagua no sumo tenro do teus beijos
O teu peito é um silêncio de promessa que chama por mim
Com o mar agitado dos desejos

O teu corpo é enseada funda junto à praia
Com vento que empresta a graça aos teus cabelos
O teu corpo é um poente de aço que desmaia
Com braços que se enlaçam em desvelos

O teu ventre é planície de cal junto à cidade
Com muros tão altos como o céu de onde te vejo
O teu ventre é uma curva de sombra na claridade
Com lume ardendo na carne quente do meu beijo

RM

regresso|

Vem comigo sonhar as ondas do regresso
E desatar a linha do horizonte enquanto brilha
Vem e sê da fome o longe que te peço
E demora no fogo do sangue que fervilha

Vem comigo morrer mil vezes antes da morte
E acordar de novo no canto da luz que se levanta
Vem comigo desenhar na areia um novo norte
E ser do tamanho do silêncio que se espanta

Vem comigo ser mil vezes destruída
E acordar da terra nas flores que se desnudam
Vem comigo dizer do amor a rima proibida
E ser o chão das coisas que não mudam

RM

talvez não saibas|

Talvez não saibas que ainda te levo na pele
E ainda sinto nas veias o sonho dessa promessa adiada
Talvez não saibas que ainda te sinto na boca
Como um braço de luz na alvorada

Talvez não saibas que ainda te levo ao mar quando anoitece
E ainda dispo nas ondas a distância em que te escondes
Talvez não saibas que ainda ouço teus passos no escuro
E o meu peito é um lanço de escadas que estremece

Talvez não saibas que ainda te levo na voz
E ainda sinto a dança do teu peito estremecendo
Talvez não saibas que ainda faltam luas para o fim
Porque o amor é sempre o que falta no que vou sendo

RM

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

vou com o vento|

Vou com o vento dormir ao fim do horizonte
E ver arder as horas sem que elas me gastem a vida
Vou com o vento dormir no colo da noite em cada fonte
E não querer sequer a despedida

Vou com o vento beijar o mar e beber do sal o infinito
E ver da terra o ventre largo, inteiro e luminoso
Vou com o vento ouvir ao tempo o que foi dito
E saciar, enfim, o estar saudoso

Vou com o vento dançar nas rochas como num templo
E sentir da noite o corpo quente e movediço
Vou com o vento dentro do peito se contemplo
A memória da tua boca jurando compromisso

RM

Avô,

O mar procura-te como se ainda existisses
Na centelha de fogo do resto de dia que finda
O mar fala de ti como se repetisses
As histórias da infância ainda
 
O mar procura-te como se te esperasse
Chegando devagar à terra sem pressa
O mar procura-te como se regressasse
O dia em que a vida, calma, recomeça
 
O mar procura-te como dizendo saudade
E persiste na valsa procurando-te no cais
O mar procura-te com infinita bondade
Como quem crê que não demoras mais
 
RM

Mãe,

Quem te chamou fui eu
Como se corresse livre no verde da paisagem
Quem te escolheu fui eu
Para ser no mundo a luz de cada imagem

Quem te viu sempre em todas as flores fui eu
Como se teu rosto fosse da vida eterno mar
Quem te escutou fui eu
Para a cada palavra, enfim, saber amar

Quem te alcançou fui eu
Como se um beijo fosse tudo o que queria
Quem te abraçou fui eu
Para nascer da noite um alto dia

Quem te decorou fui eu
Como se na vida tudo viesse já tarde
Quem te salvou fui eu
Nas memórias compridas que o peito guarde

RM

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

amor|

Sei que o nosso amor em tudo continua
Como o vento que na esquina sopra correndo
Sei que o nosso amor é a luz da lua
Que mesmo nova acaba vivendo

Sei que o nosso amor em tudo continua
Como um rio que regresse ao mar
Sei que o nosso amor é a verdade crua
Que me há de libertar

Sei que o nosso amor continua
Como uma brisa que se levante
Sei que o nosso amor é terra nua
É estrofe acesa, enorme e triunfante 
 
RM

luz|

Quero a luz que principia quando falas
Como se engolisses a noite
Quero a luz em que as coisas voltam ao lugar
Como se a noite fosse tua
Quero a luz inteira ao chegar
E ao correr para te ver nua

RM

teu peito|

Teu peito abre-se como uma janela
Em que fico chamando teu nome
Teu peito é uma rosa na lapela
É um vento ágil que se some

Teu peito é um promontório de luz e de saudade
Em que me deito lembrando dos dias
Teu peito é uma noite alta na cidade
É um livro de rimas e poesias

Teu peito é um canteiro aberto em flor
Em que demoro o tempo e a vida
Teu peito é da estrela maior todo o fulgor
É loucura e luz e longe sem medida

RM

quantas ondas tem o mar|

Quantas ondas tem o mar
Que o trago dentro do meu peito
Quantas ondas tem o mar
Que traz no vento um sonho feito

Quantas ondas tem o mar
Que corre dentro de mim com tanta pressa
Quantas ondas tem o mar
Que é como um amigo que regressa

Quantas ondas tem o mar
Que é como um espelho que é meu
Quantas ondas tem o mar
Porque aquele mar sou eu

RM

casa|

O teu corpo é a minha casa
E da noite que cai, eu guardo os beijos
O teu corpo é um sol em brasa
Areia quente da espuma dos meus desejos

RM

prece|

Os deuses a quem rezo moram nas flores do teu sorriso
E o que lhes peço é o pecado maior de sentir na boca o teu beijo
Rezo com a fome do que preciso
E com o lume que queima do meu desejo

Os deuses a quem rezo moram na memória de luz da tua voz
E o que lhes peço é o pecado maior de sentir no peito que me abraças
Rezo com promessas tolas para ficarmos sós
E sentir que é Primavera quando passas

Os deuses a quem rezo não quiseram entre nós qualquer distância
Porque ensinaram ao meu peito que se abra quando vens
Quando demoras, somos da sombra os reféns
E no sangue derrama o medo toda a ânsia

RM 

nos teus dedos|

Nos teus dedos, o fogo último do dia
E no silêncio em que te escondes, a nudez do teu olhar
Eram medos tudo o que o teu corpo despia
Era tudo fome nessa forma de amar

Nos teus dedos, a pontuação assustada da vida
E no escuro da noite, vou morar-te a solidão
Tudo é uma valsa doce e repetida
Em que, sorrindo, te dou a mão

Nos teus dedos, todas as cartas inventadas
E no colo de um abraço, vou roubar-te os segredos
Tudo é a memória dos beijos que me davas
Em que o amor era o antídoto dos medos

RM

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

encontro|

Hei de encontrar-te numa rua de um Outono longo e calmo
E rir de imaginar que te agarras ainda ao lume do meu corpo

Hei de encontrar-te perdida na luz que se emudece
E bordar no teu peito a força de um vento inicial

Hei de encontrar-te com a força de uma maré que te dissesse
Que tudo era sombra de um amor que era real



RM

domingo, 8 de dezembro de 2013

Ao Né|

A luz dividiu-se logo no princípio dos dias 
E no silêncio tudo o que tive foi a impressão de um abraço
Era tudo amor o que no escuro já dizias
Eras já tu - o outro lado do caminho, a cada passo

O tempo empurrou-nos juntos para o poente
E foi nessa mesma luz que aprendemos o infinito
Teu coração olha-me de frente
E sabe tudo o que não precisa de ser dito

Sou teu como um desejo de horizonte todo mar
E guardo de ti o abrigo de cada palavra
Sei que viver foi ter vontade de caminhar
Por saber que eras tu quem me esperava

RM

sábado, 7 de dezembro de 2013

Vóvó,

O caminho começa no tempo que não temos
[e o tempo não chega]
Para querer os dias como crianças que correm
E falar na noite como um incêndio de luz
[e o tempo não chega]

O caminho começa nas palavras que não trocámos
[e o tempo não chega]
Para querer o calor cúmplice como uma Primavera tardia
E guardar um do outro a verdade que ainda não vimos
[e o tempo não chega]

O caminho começa nos abraços que não demos
[e o tempo não chega]
Para perder o medo e querer eterno o perfume do jardim
E ficar preso na liberdade maior do afecto
[e o tempo não chega]

Mas eu quero um tempo infinito
Porque infinito é todo o tempo do amor
E somos sempre crianças que correm

[E as crianças não morrem.]

RM

Avô,

Tudo na luz me lembra o princípio
E na paisagem não há longe que os olhos não abracem

Tudo no chão me lembra dos passos
Por mais sombras que nele passem

Tudo no sangue chama por ti
E nas ruas dentro de mim não vou sozinho

Tudo na luz me lembra o princípio
E de ti como tecto da parede do caminho.

RM

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

tu|

És toda do grito que na luz se levanta
E teu corpo é sombra de sonho e lume no dia que termina
É quando o meu peito te sente que se espanta
Como uma cidade que se ilumina

RM

manhã|

A manhã é a noite branca em que o amor arde e persiste
E a luz é toda dos meus olhos que te despem outra vez
O dia é a cinza e o sono da fome que resiste
E o tempo é a estrada longa do que se refez

RM

vem|

Minha pele é dos caminhos, teu regresso
E teu corpo é dos ventos, o abrigo
Esta noite, se vieres, fica comigo
E tua boca é dos desejos, o que peço

RM

sábado, 23 de novembro de 2013

Avó.

O azul dos teus olhos é um mar doce no abraço
E tua voz é frescura de cetim voando ao vento
Levo-te comigo em cada passo
E guardo de ti, com luz, cada momento
RM

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

tu|

Teu sorriso é janela rasgada
E teus olhos são do mar a luz maior
Teu ventre é deliciosa escada
E teu peito uma noite de fulgor

Nossas mãos são versos trocados
E teus gritos prosa inquieta
Teus desejos são segredos guardados
E teu coração porta aberta

Teus cabelos são ondas beijando-me o pescoço
E tuas carícias são ferro ardendo no negrume
Meu corpo traz a pressa como um moço
Que no sangue tem da fome todo o lume

RM

ventre|

Teu corpo é jardim de maresia e de infinito
E teu peito é de todos os abrigos o maior
Teu ventre é praia doce e sem rumor
Onde vive e dura sempre o interdito

RM

corpo|

Podendo, fica.
Querendo, beija.
E deixa que o chão que frutifica
Seja um corpo inteiro que deseja

RM

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Mãe,

De todas as palavras a primeira - para ti
E de todos os caminhos para ti - o norte
Por ti saberei sempre que vivi
Com um sorriso de luz inteiro sobre a morte

RM 

fome|

Nos teus olhos a noite não termina
E dançam em meus lábios os beijos que te não dei
Nos teus olhos é a luz quem te domina
E em mim a fome com que te amei

RM

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

rochedo|

Entrego-te com a pele os meus segredos
E durmo com a noite nos teus braços
Sou como a espuma beijando os rochedos
Querendo tocar de ti os teus pedaços 

RM

teu peito|

Teu peito é a varanda mais perfeita
Em que o ferro do orgulho se encolhe
Teu peito é uma estrofe que se enfeita
Com rosas frescas que a boca colhe

Teu peito é um anoitecer tardio
Em que o vidro traz dos corpos a lembrança
Teu peito é um galope fugidio
Em terras de luz e de bonança

Teu peito é um grito assustado
Em que os corpos se abraçam no escuro
Teu peito é um sonho ampliado
De céu, de chão e de futuro

RM

desejo|

Não sei que faria sem ela
E sem seu ventre de vento todo ardendo
Não sei quem viria à janela
Para ficar na minha boca sempre lendo
Que um céu de infinito se revela

RM

despedida|

De olhos cerrados
Lembro do teu corpo a forma inteira
E em teus braços espero ainda a noite prometida
De olhos cerrados
Lembro da tua boca a promessa derradeira
E em meu peito adio sempre a despedida

RM

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

ventre|

De todas as falésias - o teu ventre
E em todos os sulcos - os teus ossos
De todas as noites - a que entre
Para abraçar os corpos que são nossos

RM

vento|

Que dizes ao vento que parte
Dos sonhos que contigo ficam?

Que dizes ao vento que parte
Do corpo que não segue no caminho?

Que dizes ao vento que parte?

Não vou, não estou sozinho.

RM

amor|

Diz de todas as palavras a primeira
A que traz dos dias a luz e a amplidão
Diz de todas as palavras a inteira
A que desfaz com fome a solidão
Diz de todas as palavras a derradeira
E deixa em meu peito tua mão

RM 

sábado, 2 de novembro de 2013

deserto|

E se teus lábios não estão perto
Deixando nos meus a luz de tudo 
O horizonte é de cimento duro e mudo
E em tudo há uma sede de deserto

RM

adeus|

A despedida é o poema recusado
Em que as palavras morrem sem rimar
A despedida é um grito incendiado
Em que o lume é o fogo de te amar

RM

teu nome|

A rima do teu nome traz no sangue a saliva
De todos os sonhos que tua boca fez nascer
A rima do teu nome traz minha vontade tão cativa
De junto ao teu corpo toda a vida adormecer

RM 

horizonte|

É quando o vento paira no ar
No colo do céu fundo e sereno
Que da janela por onde vejo o mar
O horizonte sem ti é tão pequeno

RM

futuro|

E os beijos que te der não vão chegar
Para roer inteiro o meu desejo
Tenho saudades do que não vejo
Se isso é tempo inteiro para te amar

RM

rosas|

Deixas rosas em meu peito como num jardim
E cada pétala é verso de carne com teu nome
Há em meu peito um vazio todo fome
Se acaso não estás sorrindo junto a mim

RM

poesia|

Na areia do teu corpo escrever a noite
E deixar no firmamento as palavras do encontro
Na espuma dos teus beijos receber o dia
E retomar, inteira, a poesia

RM

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

de que noite, meu amor|

De que noite vens, meu amor
Que em teus olhos as avenidas são corredores de solidão
De que noite vens, meu amor
Que em teu corpo o sangue corre em contramão
De que noite vens, meu amor
Que tua pele é poente escuro de saudade
De que noite vens, meu amor
Para querer comigo no dia a liberdade

RM

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

vento que sopra|

O vento que sopra correndo
Traz do teu nome a rima fugidia
E é ao vento que passa correndo
Que eu digo quem mais queria

O vento que sopra correndo
Traz do teu corpo a sombra desenhada
E é ao vento que passa correndo
Que eu digo quanto és amada

O vento que sopra correndo
Traz de ti a saudade em flor  
E é ao vento que passa correndo
Que eu falo da minha dor

RM

despedida|

Como um rumor de folhas estalando
Nossas bocas se unem sobre a vida
Com um rumor de corpos se abraçando
Em nossos ossos se adia, enfim, a despedida


RM

rio|

Vejo um rio correndo sozinho
E teus braços são da ponte a pedra da saudade
Vejo um rio correndo de mansinho
Esperando na noite, ao fundo, a liberdade

RM

primavera|

O teu nome é Primavera tardia
De mil flores postas sorrindo no mundo
O teu corpo é eterna maresia
É sol sob um mar verde e profundo

RM

sonho|

Sonho manhãs nascendo em teus seios
Em que tudo seja luz e nada mais
Sonho volúpias sem tamanho e sem receios
Em que sejamos sempre eternos e reais

RM 

beijos|

Deito-me em teu corpo como num jardim
E todos os sonhos eu vou refazendo
Deito-me contigo se dizes que sim
E as flores são beijos ardendo

RM

domingo, 20 de outubro de 2013

poente|

Depois do beijo que me deste
Há um fio de noite que não cessa
É um poente que de novo recomeça
Na areia do bem que me fizeste

RM 

relento|

É no relento do teu corpo
Que meu coração inteiro se expõe
É na noite alta dos teus beijos
Que o mundo se cala e a dor das coisas se compõe

RM

mar|

Quando avisto ao longe o mar
Há uma noite que se ergue de repente
E é quando avisto ao longe o mar
Que tudo é brisa e escuro e sonho de repente

RM

dos teus olhos|

No vidro dos teus olhos se ergue o mundo
E nosso amor é uma enorme fortaleza
Tua boca é o mar sereno e mais profundo
E em meu peito me nasce uma certeza

RM

lume|

Tua pele são ondas na borda dos meus lábios
E teus braços são do tempo o fim e o silêncio
Nossos corpos são luz, são lume num incêndio
E de todos os desejos os mais sábios  

RM

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

sangue|

O meu sangue é como um rio
Que escolhe teu mar para buscar
Teu corpo é lume quente no Estio
E rumor na noite a começar

RM

os teus lábios|

Nos teus olhos a noite traz estrelas
E em teu corpo as vielas são sombras de desejo
Ouço palavras e ao dizê-las
Tua boca me lembra um beijo

RM

liberdade|

Sempre que teu chão não pouse em meus braços
Procura no céu a luz da cidade
Refaz inteiro dos pedaços  
O mar da nossa liberdade

RM

firmamento|

Como um abraço no escuro do mundo
Guardo teus olhos no fio do tempo
Guardo dos beijos o mais profundo
Que foi luz no firmamento

RM

terça-feira, 8 de outubro de 2013

sonho|

A manhã inclina-se na linha do teu ventre
E todas as vésperas são ecos de vida
Que venha a luz, que inteira entre
Para te beijar a boca adormecida
RM 

primavera|

Passas e não me levas debaixo do vestido
E és primavera fugindo na rua
Passas e és um sol mil vezes repetido
Ardendo em brasa na pele nua 

RM

infinito|

O dia dorme perto do fim
E da vida sobra ainda o infinito
Vem esperar junto de mim
E ousar, em tudo, o interdito

RM 

beijos|

Percorro o teu corpo como uma rua
E em tua pele deixo segredos guardados
Vivo inteiro na imagem tua
E dos corpos enlaçados

RM

luz|

Mastigo fundo o sabor dos teus beijos
E dorme na areia fome tamanha
Prova na boca a espuma dos meus desejos
E sê luz na sombra que me acompanha

RM

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

tu|

As ruas são ainda tuas nas sombras vazias
E as flores são ainda nossas com o perfume adiado
Tudo era ainda teu e tudo és ainda tu 
Sempre que sorrias comigo ao teu lado

RM

noite|

Agarra, ainda, a espuma dos beijos repetidos
E das horas que faltam guarda nos olhos a luz
Agarra, ainda, da brisa os sonhos perdidos
Enquanto a noite é sombra que seduz

RM

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

portugal, um retrato social|antónio barreto


amor|

O teu nome é o sopro de todas as lembranças
E do teu rosto as janelas são o espelho mais perfeito
O teu corpo é luz ardendo sempre nas mudanças
Que traz um amor, a cada dia, sempre feito

RM

sem ti|

O vazio arde inteiro como um fogo denso
E as paredes são muros de pedra na distância
É em ti que a cada hora eu penso
E no meu peito o céu é chão de toda a ânsia

RM

tu|

O teu corpo por dentro
É de todos os prazeres o mais deslumbrado
E tua boca é das verdades a mais pura no escuro do mundo
Meus braços são fogo ardendo num abraço apertado
E teus olhos são dos mares o maior e mais profundo

RM

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

vestido|

O vento levanta com beijos a roda do teu vestido
E teus cabelos desenham na luz uma graça desmedida
Tudo no ar é um eco de chuvas repetido
Como na noite a luz é sombra de gente já sumida

RM



de ti|

A noite recomeça em teu nome o doce sono do tempo
E as ruas são dunas de silêncio em que teu corpo se emudece
Às tuas mãos o medo morre inteiro e cessa o desalento
Como um lento florir que então comece

RM

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

lume|

As rosas de teu nome nunca murcham
E a sombra de meu corpo dorme sempre com a tua
São dois corpos que da noite a vida puxam
Queimando juntos, no lume, a carne nua 

RM

meu amor|

Chama noite, meu amor, ao dia que começa
E adia mais um pouco, se puderes, a despedida
Fica comigo sem que nada mais te impeça
De querer comigo, em tudo, mais que a vida

RM

terça-feira, 27 de agosto de 2013

eco|

Eu espero-te mas minha boca é quem te chama
Querendo que o eco sejam teus lábios chegando para ficar.

RM

recomeço|

Recomeçar todas as palavras na tua saliva no meu corpo
E inventar no fogo dos teus beijos um chão sem sombra e sem distância
Recomeçar a vida na espera dos teus olhos
E não trazer no bolso jamais nenhuma ânsia

RM

contigo|

Eis que o dia escorrega lentamente
E teus olhos são, de súbito, irmãos da noite que já dorme
Eis que o mundo se esquece finalmente
E meu medo dentro de ti inteiro some

Eis que o tempo se verga quando passas
E as horas em cinzas esvoaçam
Se em teus braços, acaso, tu me abraças
Não vou mais nas sombras que, ao longe, passam

Eis que a pele das coisas se ilumina
E tua boca, de súbito, me gasta nos lábios a saudade
Eis que a valsa do desacerto, então, termina
Com beijos de fome e de verdade

RM 


segunda-feira, 26 de agosto de 2013

são beijos, meu amor|

São beijos, meu amor, as flores que deixo no ferro da varanda
E na manhã de prata que nasce devagar tudo começa
Tua voz em meu peito é quem comanda
E me mostra a luz dessa promessa

RM 
 

ainda tu|

É o teu corpo que deixa a sombra a arder ainda na areia da distância
E é teu cheiro que enche de ti o espaço da ausência
Todo o tempo em que te espero é permanência
Dos desejos boiando em surda ânsia 

RM

de ti|

São teus dedos quem desenha o infinito
E em teus olhos o céu é um mar que tudo inunda
É por teus beijos que teu nome só repito
E tudo é uma verdade enorme e funda

RM

domingo, 25 de agosto de 2013

manhã|

a manhã chega com o rumor suave da tua mão
e ainda nas ruas as sombras são vazias de passos e solidão
a manhã chega no vício do teu cheiro na saudade
e ainda no tempo tudo é luz que pousa na cidade

RM

não vás|

Não vás
Sem que teus beijos demorem a manhã na ponta dos meus dedos
Não vás
Sem que a janela aberta seja o fim de todos os segredos
Não vás
Sem que a rua seja toda um chão de mar e de infinito
Não vás
Sem que teu corpo seja a fome do que ainda não foi dito

RM

fogo|

É quando a noite inteira se demora
Presa no balanço dos corpos que se enlaçam
Que teus lábios ampliam o colo do silêncio sobre a luz
É quando as horas vadias todas passam
Que tudo em ti é fogo e me seduz

RM 

sábado, 17 de agosto de 2013

romaria|

O céu era de novo o de Agosto - o sol ia alto como os desejos quando os corpos aprendem essa liberdade súbita do familiar e do reconhecido. E tudo retomava o seu lugar como se a vida nunca pudesse deixar de se demorar nas horas maiores desses dias das nossas vidas.
A casa era um ventre repleto de sombras frescas, com as árvores como andores em flor correndo para a luz. Tudo muito quieto, excepto o ar que trazia um leve rumor de vida que se apressa, o passo mais agitado que antecede todas as coisas que ficam. 
E voltamos ao princípio - viver o absoluto da vida é para os bons contadores de histórias porque apenas esses sabem regressar do escuro da vida. Volto contigo, Avó, às janelas das vossas casas, às pedras das vossas ruas, ao verde do vosso horizonte. Volto ao cemitério imerso no silêncio, ainda dormindo no lençol fresco da manhã. E falo-te do meu Avô que ficou ali para ver o verde dos nossos campos que eram a sua forma mais funda de fé.
Ouço-te falar da tua Avó, dos teus Pais, dos teus Irmãos e Primos e vejo nos teus olhos que estar ali é continuar a esperar por eles, é não saber morar noutro lugar que não aquele em que alguma vez se foi feliz.
E contigo volto à missa - uma missa campal com um corpo de gente espalhado na enorme escadaria sobre o vale. Volto à fé de criança que via na luz das palavras um conforto maior do coração. E lembro a Gó que em todas as missas comigo e com o A. sofria com as nossas investidas malandras para a fazer rir. O riso das pessoas verdadeiramente boas como ela é como um traço fino na pele que nos marca para sempre.
Lembro-me de ir buscar ovos na bicicleta para o almoço, lembro-me dos cavalos soltos e preguiçosos na erva verde, lembro-me de passear com o Avô por entre o palco do vosso tempo. A romaria para mim é a possibilidade da vida ficar sempre assim; da vida ser sempre esta vida porque não quero outra para viver.
Vou à missa para agradecer mais um ano em que nos deixam juntos no caminho; para chamar ainda e sempre pelos meus sem que o barulho do mundo os tente apagar.
Sinto que vos cumpro nestes rituais - é bom voltar à pele do neto sem medo de vos perder, é bom fazer do aconchego da intimidade o pilar da vida.
Passeio sozinho por entre as árvores, visito o beiral e demoro os olhos no fundo do vale sereno. Ouço-te chamar o meu nome lá de dentro. E fico contente por sermos tão íntimos, por esta família me ter ensinado que amar é gostar tanto de alguém que não se pode querer que o outro seja perfeito. Ama-se somente quem faz do amor por nós, a razão da redenção, do perdão, da atenção extrema, do ver o que é invisível aos olhos.
Amar é inventar sempre mais uma possibilidade para o que não se quer perder. E é por vocês que volto ali - para sentir na repetição do chão e do céu que o tempo quase pode ser o mesmo, se nos nossos olhos continuar a morar essa entrega absoluta.
No céu escuro da noite, o fogo de artifício ilumina as casas com um abraço longo e terno. E neste ritual que se cumpre na noite que acaba, fica a certeza de que o amor que nos temos é sempre a vontade de mais um abraço que não podemos deixar de entregar.