Rewind

sábado, 13 de dezembro de 2008

Gostamos pelo que esperamos?

Não sei se gostamos das pessoas pelo que podemos esperar delas. Se com tudo o que vamos juntando delas em nós, o que fazemos é roubar os dias ao amanhã e imaginá-los cheios de coisas que são a nossa certeza sonhada acerca dos outros. Amamos também pelo que ainda não foi. Conscientes de que não podemos controlar o que nos acontece, os arbítrios da vida, vamos imaginando o nosso futuro um pouco menos incerto pela luz da esperança que temos nos outros.
Gostamos pelo heroísmo que lhes imaginamos, pelo amor quase incondicional que as fará dividir connosco o peso de certos dias. Imaginamos um carinho a nascer desse sítio onde nasceu o amor por nós. Gostamos porque as imaginamos a vestir-nos a pele e a saberem o quão são importantes para nós.
E quando isso não acontece? Talvez reste só o medo por detrás do cortinado espesso do resto dos dias. E toda a esperança se converta num estilhaço cruel do que não foi.
O ficarmos sós com esse sonho adiado e o mundo a doer custa muito. Custa não termos curtas-metragens de sol no nevoeiro da vida. Custa que ninguém nos rasgue a dor sem pedir e contarie o absoluto do sofrimento que nos aperta o peito.
Custa coleccionar os dias com espaços vazios que pertenceriam aos existires de outros. Porque amamos pelo futuro? Porque queremos a segurança do presente em todos os dias do resto do tempo? Porque é que o futuro quando acontece sem isso parece uma vida pela metade?
Talvez não devesse haver o céu lá no alto e o horizonte tão largo. E aí talvez não nascessem desejos de superação, talvez não me acontecesse a esperança.
A esperança quero-a por entre os medos. Para me encher esse grande vazio de incerteza. E faço-a de tudo o que se me infiltra, aqui se instala e prospera. Daquilo que me levam a acreditar que existe; do Sol que me levaram a acreditar nasceria da vontade de que houvesse luz. Mesmo quando eu não tivesse força para o desejar.
Vivemos a esperar a vida perdida? Vivemos de passar por cima dos sonhos e tantas vezes ignorar o que sonhamos como se fosse já carne?
Como superar o vazio que afinal foi tudo o que se concretizou?
Não sei. Aos sonhos que não se concretizam, guardo-os.
Como promessas que os outros me fizeram e em que acreditei. Promessas que talvez vivam agora da minha voz que as repisa e as ressuscita. Mas promessas.
E continuarei a imaginar a minha vida cheia da vida dos outros. E eu a viver inúmeros existires e vidas que o meu corpo assume como meus. E enquanto promessas se vão fazendo, é a vida que se cumpre e que é tudo o que temos. Como essa promessa que se cumpre todos os dias, enquanto se acredita.

1 comentário:

Inês disse...

'Custa coleccionar os dias com espaços vazios que pertenceriam aos existires de outros. Porque amamos pelo futuro? '

Lindo. Vou pensar na resposta a essa pergunta e depois comunico. Só sei que é bom - e por isso quase sempre incontornável - meu querido stranger.