Rewind

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Amanhecer.

Apetece-me vestir o teu corpo
No frio dos primeiros raios de Sol
Usar a tua pele como abrigo
Nas horas vadias do amanhecer
E coser a tua pele na minha
Até, enfim, o dia nascer.

Mãos.

Segurarei na tua mão sempre.
Morará na tua pele a memória do que diziam as linhas em mim escritas
Como um segredo que se ouve

E não se diz.

...

tenho saudades dos teus braços. de sempre neles encontrar o que me falta ou de neles deixar o que me sobra.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Warholic


Saudade

A saudade mostra-nos sempre o caminho. Nem sempre o mais fácil; às vezes, muitas, um que não é já possível. Por isso, a saudade é o maior tempero do orgulho. Uma dose infinita de humildade quando temos escrito em nós, um nome que não é o nosso.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Verão

Sempre pensei que tudo existia mais pelas pequenas coisas. Não gosto desses momentos em que tudo se parece cravar no fundo do olhar e do peito de alguém. Gosto desse toque manso a lembrar um caminho ja percorrido.
Gosto quando a vontade veste o hábito e se enrola nele, muito serena. E poder-se, enfim, amar ou segurar nas coisas com essa calma de quem sabe que as coisas continuarão amanhã.
Como os dias de Verão em que podia quase jurar que a luz ia durar para sempre. E todos os dias seriam dias para ver a tua pele banhada de esperança; reparar como o suspiro quente das horas te balança o cabelo suave. Como era bom adormecermos deitados no chão, com a sombra a embalar o teu corpo abandonado ao meu. E tu acordares-me com um beijo suave - como um até já de quem vai lá dentro e traz limonada fresca. Podia reparar na graça do teu vestido e na sombra que nascia dele para inundar o chão. Sei que vieste depois e bebemos a limonada - os teus lábios com um sabor ácido, o verão e esse vestido.
Não sei que palavras se disseram - ou talvez saiba- mas não tive medo de que elas fugissem ou desaparecessem. Pudemos dormir juntos na sombra e beber limonada e respirar fundo.
Ambos agimos como se as coisas fossem durar para sempre - todos os verões da nossa vida, com limonada, calor e um cão, que sabes como gosto deles.
(e os filhos, talvez.)
Bonito Verão, esse. Descobri que podia ser mais fundo e penso até que o ar passou por partes de mim que desconhecia. Como se se abrisse uma janela e ficássemos suspensos na contemplação.
Gostava do hábito - sem essa monotonia que murcha as flores do jardim, lá fora, e as nossas emoções. Gostava da pele um do outro nos servir tão bem.
E desses beijos miúdinhos e pequenas palavras susurradas ao ouvido. Dessa gargalhada que quase podia imaginar a ocupar os serões de todos os dias ainda por vir.
Não pus a perda a jantar connosco e a dormir connosco nesse embalo perfeito.
Dizer as palavras e fazer as coisas soarem a despedida era começar a desenhar-lhes um fim.
Quando nem o vemos e, sim, acreditamos que os verões serão todos nossos, o nosso gesto mergulha nesse ir ao fundo - como se o ar os enchesse todos. Amar com o gume da paixão bem afiado é ir ao fundo das coisas, mas queimando o ar.
Por isso, lembro esse Verão - e todas essas pequenas coisas que semeaste nos meus poros e me coseram na pele o gosto por um amor que pode morar num simples rodar de vestido; numa tarde abafada em que te vejo dormir e te sinto respirar perto da minha face.
Um amor que pode durar todos os verões da nossa vida.
Com o calor, a limonada e o vestido.
E um cão que sabes como gosto deles.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Match Point




«The man who said "I'd rather be lucky than good" saw deeply into life. People are afraid to face how a great part of life is dependent on luck. It's scary to think so much is out of one's control.
There are moments in a match when the ball hits the top of the net, and for a split second, it can either go forward or fall back. With a little luck, it goes forward, and you win. Or maybe it doesn't, and you lose.» in Match Point, Woody Allen

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Caminho

Passo à rua o passo perdido
No céu a luz que desmaia
No peito fechado do Inverno
Que chegou há dias
Passo os olhos na face sombria
Do granito cinzento da Avenida
E o que passa em mim é o teu amor
Revelado no súbito conforto dos ossos
E na ampla esperança que se rasga no horizonte
O mundo que passa e por onde passo
É o que te tem por limite
A cor dos teus olhos avivando as horas
O calor do teu corpo apagando as sombras
E tudo o resto que passa
São rostos que desconheço
De moradas que não são minhas
Porque se acaso passo à rua
Perco-me para te encontrar
Posta a brilhar na face do mundo
Que, em breve, dormirá.


Ricardo Pinto Mesquita


terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Escrevi teu nome no vento por Carminho

Bright star

"Touch has memory."

Bright star, would I were stedfast as thou art--
Not in lone splendour hung aloft the night
And watching, with eternal lids apart,
Like nature's patient, sleepless Eremite,
The moving waters at their priestlike task
Of pure ablution round earth's human shores,
Or gazing on the new soft-fallen mask
Of snow upon the mountains and the moors--
No--yet still stedfast, still unchangeable,
Pillow'd upon my fair love's ripening breast,
To feel for ever its soft fall and swell,
Awake for ever in a sweet unrest,
Still, still to hear her tender-taken breath,
And so live ever--or else swoon to death.

John Keats

domingo, 10 de janeiro de 2010

Silêncio

Guardo na minha boca o silêncio
Onde boiam os beijos
Que me deste
Todos os dias
Depois do dia
Que foi o primeiro
Em que o que se disse nos nasceu da pele
Para ir morrendo na ponta dos meus dedos
Presos perpétuos na areia macia do teu corpo.

Ricardo Pinto Mesquita

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

domingo, 3 de janeiro de 2010

Comboios

O comboio parado na linha. Luz saindo do ventre da estação pelas portas abertas, em dia de chuva. A mesma paisagem da chegada. E tudo o que nos nasce debaixo da pele, banhado por essa satisfação interior que nos ata os pés ao chão.

O mesmo banco de há meses ou anos atrás - a madeira e o seu colo apelativo para quem sabe que não vai poder ficar. Os mesmos gestos e ruído de fundo, rostos que parecem todos iguais. E, no meio da multidão, alguém que nos espera e que esperamos também.

Os locais têm sempre o rosto de alguém como as músicas têm as vozes que as dizem. Gostava daquele sítio - os braços que sempre o receberam. Alguns que já não estavam ali à espera. Às vezes, passar nos mesmos sítios o corpo e a memória provoca um eco no fundo do peito. Mas é sinónimo de saudade - uma saudade que podia não morrer. Sabia bem viver com ela - como se os instantes de felicidade que se viveram fossem provas que guardamos contra o que veio depois.

Curioso como podia tanta coisa habitar aquele caminho de ferro, gente e luz. Voltara sempre para viver depois de uma perda - para habitar a morada um pouco mais vazia. E, sim, é verdade que da esquina de uma rua, do sol que morre na relva quente de um jardim, saltava, por vezes, o eco de memórias silenciosas que talvez agora apenas ele visitasse. Mas sabia-lhe bem essa camada de vida que morava na pele de todos aqueles lugares.

A evocação era como um filme a que assistia em silêncio. Sabia de cor as deixas dos outros - e de alguns dos que se foram perdendo, sempre guardara as palavras - como pedaços que iluminam o que vamos sendo uns aos outros.

De novo, a estação e o rio como uma baínha perfeita de luz e acalmia. O trânsito com o pulsar da vida preso no asfalto. E, enquanto esperava, fazia uma visita a todos e a tudo o que ainda morava ali.

Sempre gostara de comboios - há sempre dois extremos e, no meio, esse elo que une o que se deixa ao que se vai encontrar. O sabor do regresso, essa paisagem reconhecida pelo vidro do caminho. E sempre o que acontece depois, misturado no pó do que já foi há muito e que a aragem do caminho vem sacudir .

Os comboios significavam para ele quase o mesmo que a vida. A certa altura do caminho, alguém pode sair. Há estações em que se parte. Outras em que se chega. Mas pelo rosto familiar do caminho, há estações onde se volta depois da partida.

Gente, ferro e luz. E alguém que sai da multidão.

A próxima deixa:

"Fica."



Un prophète