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sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

para ti|

Querer-te é como na manhã o sol num beijo fundo
E na praia um mar gigante que o tempo não domina
Sonhar-te é trazer na borda da pele fome de mundo
E saber que contigo o infinito não termina

Lembrar-te ao passar na rua que desperta
É como sentir de mil carícias a frescura
Meu peito é uma janela sempre aberta
Onde chega de ti na luz toda a doçura

São para ti as flores que dei ao vento
E minhas mãos são o perfume que te beija
És na pele de tudo como o firmamento
E és tudo o que o meu peito enfim deseja

Regresso a ti para deixar no sonho um tempo novo
Em que a graça das coisas seja perene como os dias
É por ti que na corrente da vida eu me movo
E no meu peito guardo tudo o que dizias

RM

manhã|

Invento depois das sombras a areia do teu corpo
E em cada resto das horas relembro-te na minha boca
No lume alto da pele e do desejo consumindo a noite
És tu quem chega no abraço do horizonte que se abre

Da janela do desejo vejo ondas que trazem tua forma
E o céu tem o tamanho de uma saudade que se inventa
Depois de todas as palavras que juntos rejeitámos 
É enfim nosso o jardim enorme em que toda a terra é de silêncio

Trago ainda dos beijos um resto morno de eternidade
E demoro no caminho o corpo dormindo ainda contigo
É na manhã de sal que serena se anuncia devagar
Que tudo é uma promessa que se toca com os olhos

RM

quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

querer-te|

Querer-te é ter nos olhos um jardim
Em que as flores são os passos que acabam quando chegas
Querer-te é trazer na boca o sonho aceso e carmim
E roubar-te na pele o voo que me negas

Querer-te é inventar um poente irreal
Em que a forma das coisas é o teu corpo junto ao meu
Querer-te é um delírio tão completo e total
Que meu nome é o chão que te ergueu

Querer-te é trazer comigo o vento da procura
E buscar de ti em cada dia a luz despida  
Querer-te é mergulhar inteiro na loucura
E nascer de novo na manhã adormecida

Querer-te é do Estio uma lembrança
Em que as luzes dançam a noite inteira 
Querer-te é ser um pássaro que se lança
Na viagem final e derradeira

RM

sabe que te espero|

Sabe que te espero no início da praia
E ainda visto o desejo de que venhas com a luz enorme do silêncio
Sabe que te espero no início da praia
E ainda habito o fogo do Verão tardio em que te quis
Sabe que te espero no início da praia
E ainda seguro nas mãos as flores dos beijos que são teus
Sabe que te espero ainda no início da praia

Para adiar na carne e para sempre a chaga infinita do adeus.

RM

sábado, 11 de janeiro de 2014

sonho|

Pousa no meu ombro a mão do sonho
E é teu rosto que vejo na luz de tudo
És para mim como a soma de mil vidas
Em que me sinto inteiro e não mudo

Chega aos meus olhos o mar em que te encontro
E de novo a noite é promessa de futuro
És para mim um olhar que se espanta no caminho
E um grito de fome em que perduro 

É o brilho da tua boca que vem no céu
E traz minha pele o mapa do caminho que traçaste
És para mim lugar de sonho e maresia
Em que durmo sabendo que me amaste

Sei que chegarás sempre com teus olhos
E neles eu verei que sonho trago
Por ti andarei caminhado neste mundo
Buscando em tudo o teu afago
RM

quase tu|

É quase tua boca a poesia de uma folha de Outono que se deita
E é quase teu o brilho das coisas que acordam para a luz no dia
És quase tu na doçura quente e perfeita
Da memória das palavras que dizia 

É quase teu ventre a areia das dunas que se enlaçam
E é quase teu o brilho da cidade que desperta
És quase tu no rumor dos ventos que aqui passam
Como numa sina longa e certa

É quase tua a vertigem do horizonte que me chama
E é quase teu o desejo infinito de regresso
És quase tu no vidro do mar que se inflama
Ao ouvir-me no peito o que confesso

És quase tu nas flores que nascem do teu nome
E é quase teu o luar da noite que começa
És quase tu no fundo aceso desta fome
Que morre na luz do teu corpo que regressa

RM





a ti|

É na manhã que se ergue como um vento 
Que ainda sinto de ti o corpo quente
Sinto na carne o lume do momento
Em que quis amar-te eternamente

É no silêncio da manhã que se demora
Que te deixo na pele rimas de lume
É por ti que conto cada hora
Na ausência procurando teu perfume

É no mais alto das estrelas que te vejo
Com teu corpo tendo a graça de mil aves
É com meu sangue inteiro que desejo
Morrer nos beijos doces e suaves

É por ti que na noite me procuro
E nas flores da janela dos teus olhos eu me sei
É por ti que no pó da terra me aventuro
A inventar de novo o que sonhei

RM



quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

na casa onde moro|

Na casa onde moro
O tempo é um menino que no vidro espreita curioso

Na casa onde moro
As salas são grandes como se o jardim crescesse dentro delas

Na casa onde moro
A luz demora-se num beijo longo e copioso

Na casa onde moro
Toda a vida espreita nas janelas

Na casa onde moro
É que o tempo se esquece de partir

Na casa onde moro
É que o som da distância deixa de se ouvir

Na casa onde moro
Há um menino que corre há muito tempo
Corre, rindo, por entre as árvores do jardim
E traz nos olhos um sonho que se ouve
Como se pudesse ficar correndo sempre assim


RM

infância|

A infância parece ao longe um enorme jardim
Em que o chamar rouco do mar se ouve sempre
É no jardim da infância que de mim
Fica o retrato definitivo e permanente

A infância foram todos os sonhos trazidos pelo vento
Em que a praia era um corredor aberto de areia
A infância foi gravar na pele cada momento
E trazer no peito sempre a alma cheia

A infância foi julgar-nos para sempre imortais
E por entre as rochas ir colhendo os frutos vossos
A infância foi a terra e o céu para sempre essenciais
E no pó do tempo desenhar de vós leves esboços

A infância foi de todos os tempos o maior
E nela foram sonhos todos os pássaros do céu
A infância foi o amar do mundo mas sem dor
Porque o maior dos pássaros era eu

RM

Avô,

Sonho que voltas
E que pela tua mão o verde tenro do chão se chama casa

Sonho que voltas
E que meu coração já não se cansa nas esperas

Sonho que voltas
E que rindo me escondo contigo no jardim

Sonho que voltas
Para trazer na luz o lado mais feliz que houve em mim

RM  

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Mãe,

Aprendi no verde dos teus olhos a ver o mar
E no rumor do teu abraço sonhei que era isso que era a vida
Aprendi na luz dos teus cabelos a ver o vento chegando
Como uma promessa de infinito sempre repetida

Aprendi no doce labirinto das palavras a encontrar paz
E na noite escura das esquinas a esperar regresso
Aprendi contigo que o amor é o incêndio mais voraz
Em que por ti me salvo e me confesso

Aprendi na areia da tua pele em que chão se estende a liberdade
E na vertigem da distância a escutar o tempo
Aprendi contigo que no ventre escuro da cidade
Alguém sempre escolhe olhar o firmamento

Aprendi contigo que quem sonha vê mais alto
E que o sonho é maré que chega com a luz
Aprendi contigo que toda a felicidade é um sobressalto
Em que no escuro vemos mais quem nos seduz

Aprendi contigo que a realidade às vezes se agiganta
E nela cabem paisagens de coisas nunca ditas
Aprendi contigo que o peito já não se espanta
Se o rio trouxer fundo mais desditas

Aprendi contigo que todo o caminho é promessa de amanhã
E que as janelas se abrirão sempre sobre o mar
Aprendi contigo que é aqui, Mamã,
O espaço e o tempo de te amar

RM

o teu nome|

O teu nome é palavra inventada
Para cobrir de luz o deserto do mundo

O teu nome é no escuro abismo do tempo
O céu como um mar doce e profundo

O teu nome é faca que desfaz o negro véu
Em que o sonho da vida é maior e mais fecundo

RM 

céu aberto|

O teu nome é o descampado em que a noite só se deita
E teus olhos são o espelho de cada coisa mais bela
Tua boca é na minha pele fruta doce e desfeita
Como um segredo que no silêncio que arde se revela

O teu olhar é na luz um pensamento
Em que teus dedos são na areia vagos beijos
Somos mais do que a vida num momento
Se na carne queimamos os desejos

Vem comigo deixar na praia o que nos ata
E caminhar serena em direcção ao tempo que não temos
Verás que é aqui que a felicidade nos retrata
Na promessa doce do futuro que seremos

Foi por ti que nas aves que eram livres, procurei
E foi por ti que em todas as ausências me quis teu
É por ti que um dia longínquo morrerei
Para roubar à morte o último beijo que era meu

RM





sábado, 4 de janeiro de 2014

do teu ventre|

Teu ventre é uma cidade anoitecida
Em que o silêncio demora o beijo já sem pressa
Teu ventre é uma promessa adormecida
Que se cumpre sempre no dia que regressa

Teu ventre é uma carta escrita com o lume
Em que se afogam do mundo os medos tristes
Teu ventre é de uma faca o doce gume
Em que comigo matas e persistes

Teu ventre é do licor o travo doce
Em que demora o cheiro eterno do desejo
Teu ventre é como um sonho que já fosse
Nos teus lábios a brisa do meu beijo

Teu ventre é do amor a vontade de ficar
Em que os sentidos são flores abertas no caminho
Teu ventre é o chão e a terra do luar
Em que o vento não erra no caminho

RM

ausência|

Pontuar tua ausência com o excesso
Em que as sombras dançam na espera
Reconhecer em ti tudo o que peço
E poder ver repetidos os beijos que te dera 

Pontuar tua ausência com o infinito com que te quero
Em que meu corpo se agita ouvindo no vento o teu nome
Encostar o peito à estrada em que te espero
E sonhar matar no fogo a minha fome

Pontuar tua ausência com a vertigem dos teus braços
Em que a saudade morre num beijo de repente
Escutar o rumor feliz de cada um dos teus passos
E poder beber a luz dos teus olhos novamente

Pontuar tua ausência com as lágrimas que já chorei
Em que o peito é deserto banhado em solidão
Lembrar o tempo inventado em que te amei
Como se ainda tivesse na minha a tua mão

RM

poema|

O poema quem mo disse foste tu
Ou foi tua boca que na minha o deixou
O poema é o vidro do meu peito que se abre
Para o vento ágil do sonho que passou

RM

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

súplica|

Que ficasse, pediam teus olhos
E em teu peito se abriu um mar todo de luz
Que te amasse, pediam tuas mãos
E foi nelas todo que eu me pus

Que te abraçasse, pedia teu corpo 
Com medo de nas sombras dormir nu
Que te afagasse, pedia tua pele
E em mim tudo era uma carícia que eras tu

Que te abrigasse, pedia teu sonho
Com medo do tempo que demora a tristeza
Que te jurasse, pedia tua fome
Que seria teu no ferro de cada certeza

Que te escutasse, pedia teu fado
Com medo do dilúvio da distância
Que te regasse, pedia tua boca
Com beijos, o chão seco dessa ânsia

Que te roubasse, pedia tua vida
Com vontade de infinito no céu aberto
Que te olhasse com a doçura
De quem não demora e está perto

RM