Rewind

sábado, 18 de julho de 2015

Avô,

se pudesses, Avô, descer a escada do tempo

e encontrar-me cá em baixo no princípio

íamos os dois a tempo de um cigarro no jardim

íamos os dois a tempo de dizer um ao outro das saudades

que nos ficaram como frutos suspensos no lado de dentro dos braços


se pudesses, Avô, levar.me, de novo, no carro para a Aparecida

eu a ter que me sentar no banco de trás por ser pequeno

e tu a tempo de dizer,

Já não falta muito! E depois vens comigo aqui ao lado!

íamos os dois a tempo de regressar ao teu passado

e de ficar sentados na soleira da porta esquecidos de partir


se pudesses, Avô, ver como o A. se parece contigo

e como eu penso que nasceste nele de novo só para eu não ter que andar sozinho

íamos os dois a tempo de lhe dizer,

Gostamos muito de ti

e de ficar felizes por as palavras se poderem levar nos bolsos para toda a vida


se pudesses, Avô, ver como a Avó foi a escolha certa

e como continua mais bonita por causa do que lhe deixaste agarrado à pele

íamos os dois a tempo de lhe dizer,

Obrigado

e de ver a maré cheia dos olhos de quem se sabe amado para sempre


se puderes, Avô, ver como tudo ainda te espera

pede para voltares nem que seja para um cigarro no jardim

só para eu ir a tempo de te dizer,

Quando for grande quero ser como tu

(mais uma vez)

e, mesmo não fumando,

fumar contigo no jardim da nossa casa

as saudades que me ardem no silêncio que ficou.

RM

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