Rewind

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

demoras?,

amor,
 
o tempo passou ser o número de passos que a vida me demora até à tua boca.
 
demoras?
 
eu estou aqui.
 
sim, aqui, nesta cama onde me deixaste habitar-te os olhos e eu descobri que um corpo apaixonado não pode nunca ser um corpo arrependido.
 
já fechei as janelas todas, é capaz de chover.
 
e já cobri a cabeça mil vezes com este lençol de espera que tem o teu cheiro. sabes, há aqui restos de palavras, frases cortadas a saliva, pequenos rumores de poesia que fazem a cama ranger devagar.
 
sabes, amor, o desejo aperta demais as roupas sobre o corpo.
 
estou aqui.
 
sim, aqui, nesta cama onde a minha pele ensaia os versos que vou escrever no vidro da janela do teu peito depois de, juntos, o embaciarmos cinco vezes.  
 
é estranho pensar que o passado tenha que ter vindo dar aqui - um homem nunca pode imaginar que conhecer uma mulher lhe ensinará a fechar janelas para entreter o desejo.
 
ou que será por amor que o mesmo homem começa a acreditar que o futuro é como um autocarro que, de repente, passa todos os dias na rua já ali em baixo.
 
o homem corre muito, ela sorri.
 
este já é meu, diz ele, pondo-lhe no beijo a promessa de um regresso.
 
demoras?
 
amor, vem cumprir comigo, aqui, no abraço aceso das minhas pernas, o que te disse o meu beijo.
 
não sei se pode haver poemas que falem da fome dos corpos, de roupa que se despedaça para não atrapalhar o sonho; não sei se há rima que se compare ao abraço feliz dos nossos lábios.
 
não sei, amor, não sei.
 
sei apenas, amor, que incendiámos o lirismo inteiro e que o fogo chega cada vez alto quando me dizes,
 
mais uma vez,
 
demoras?
 
vem deitar-te comigo nesta cama.
 
sim, nesta cama, amor.
 
há ainda aqui restos de nós que fazem ranger a cama devagar.
 
vem sacudir comigo as estrelas todas que há no céu.
 
depois da chuva, que se abram as janelas.
 
e que a vida comece, finalmente.
 
 

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