Rewind

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

algumas coisas vão ser sempre assim,

sabes, R., algumas coisas vão ser sempre assim.
 
o teu postal no correio de manhã.
 
a tua caligrafia alinhada como uma paisagem onde mais do que palavras, eu pude ainda reconhecer tanta coisa.
 
falavas do mar, falavas-me de livros e de cinema, perguntavas como estava.
 
de ti, dizias só que tinhas saudades.
 
lembro-me da nossa pele e de haver restos de poente nos teus olhos.
 
lembro-me de te ter ensinado a gostar de escrever postais e de ser Verão e haver no mar um rumor de espera e de mistério.
 
lembro-me do teu sorriso, das nossas mãos dadas e de encontrar, de repente, o teu nome escrito no lado de dentro do peito. 
 
R., algumas coisas vão ser sempre assim - o ser Verão e apetecer-me um vestido curto e que sejam os teus olhos a tirar-mo devagar.
 
és tramada, menina - há coisas que não cabem num postal.
 
a saudade, às vezes, é quase um postal que nunca se enviou, são os silêncios em que as vírgulas se dobram a pedir futuro e isso, amor, pode ser perigoso.
 
o teu postal no meu correio, o teu nome na minha caixa de correio como se viesse apenas para olhar-me os olhos e deixar-me um arrepio fundo na pele do pescoço.
 
ler-te foi segurar, de novo, nas minhas mãos a tua boca.
 
ler-te, amor, foi imaginar que os meus olhos se abriam dentro dos teus sonhos outra vez.
 
o teu nome a chamar pelo meu - tenho saudades.
 
do teu nome vê-se o mar, as horas atrasam-se para que cheguemos sempre a tempo.
 
ri-me ao pensar que me acabavas de enviar um postal.
 
também eu me lembro de ter nos olhos umas mãos que te queriam sempre.
 
também eu trago na boca o teu sabor como um Outono em que não caem as folhas todas.
 
 
um postal como um lugar mal iluminado onde viesses apenas para me roubar um beijo.
 
sabes, amor, tenho pensado na resposta.

e talvez seja melhor voltares só para me ensinares como raio se responde a um postal de amor.

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