Rewind

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Nas ondas

A luz entrava em pequenos goles pela janela. No ar boiava o cheiro das ondas e no cabelo tinhas presa a recordação da saliva da água do mar. Dormias serena. Os olhos fechados e as mãos juntas perto do corpo cor de areia molhada.
Longe do mundo - esse encaixe perfeito do silêncio sobre os corpos; o ar que não pesa na pele e o olhar que se demora no repouso quieto das horas na luz morna de um dia quente do Estio. Gostava de provar a tua pele depois dos beijos quentes do Sol e de mais um desses dias em que os teus olhos eram o espelho dessa imensa liberdade que a luz branca da areia punha no fio do horizonte. Os olhos pesados, o corpo boiando no colo macio da brisa da tarde e sempre as tuas mãos - desenhando curvas sinuosas no relevo plano das minhas costas. O teu cheiro e o teu respirar perto de mim. E as ondas no seu embalo perfeito namorando a ladaínha contínua do vento morno e calmo. O meu peito a encontrar um novo fundo e o meu corpo a abandonar-se nesse instante de tudo. E tu ali - uma sombra derretendo-se para dentro da outra e a areia como o espelho dessa entrega simples e com sabor a salitre.
As dunas como ventres onde tudo se diluia na sua infinita brancura e suavidade. O mundo abafado pelo eco e o rumor do vento de encontro às rochas e às casas - corpos alvos e solitários num caminho de ninguém.
Dizias que pensavas que o Mundo quase nos podia deixar assim e esquecer-se de nós - suspensos no tempo que já não acompanhamos. Ficavas a ver-me dormir. Eu já acordado mas, sem que o notasses, a ver desenhar-se no teu rosto esse carinho imenso que transbordava do teu olhar meigo. Acordavas-me, por vezes, com um beijo semeado na minha testa ou na minha boca. E podia ver os teus olhos mais de perto e segurar-te no rosto enquanto esse imenso clarão e enchente sem nome e sem palavras me arrasavam o peito.
Sorrias porque eu nada dizia - as minhas mãos agarrando com força a delicada luz do teu rosto feliz.
Eram largos os dias e a vida nessa nudez frontal da total ausência de ruído que ocupasse o espaço entre nós. Eu sentia o teu pulso no beijar suave do teu suspirar junto ao meu ombro.
O amor é sempre uma forma de arrogância e de desprendimento do mundo. Nada importava ali - o ruído e as luzes apagadas sob o manto escuro de uma noite quente e funda. E, embora o mundo fosse como as ondas que apagavam e engoliam as promessas escritas na areia fina daquela praia, eu escreveria sempre bem fundo na areia da tua pele as palavras do meu amor por ti.

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